Motoboys brasileiros recusam contrato de trabalho em Portugal, entenda os motivos
Os trabalhadores que trabalham como motoboy são de 90% dos brasileiros em Portugal.
Eles estão amparados nesta força de trabalho que tomou conta das ruas do país, fundaram o Movimento dos Estafetas, como são chamados em Portugal. E organizaram resposta uniforme ao plano do governo para regularizar o setor o quanto antes.
Alinhado à diretriz europeia, o Executivo português expôs no Parlamento a proposta para que motoboys e motoristas de aplicativos tenham seus vínculos às empresas estabelecidos em contrato de trabalho dependente.
Essa discussão começou antes do recesso parlamentar e será retomada em outubro. O impasse é saber se os trabalhadores assinam contrato com multinacionais ou empresas terceirizadas que recrutam motoristas e motoboys.
A proposta passou em votação geral no Parlamento de Portugal, onde o Partido Socialista tem maioria absoluta. O governo admite alterar o texto antes do debate do próximo mês, mas o objetivo do Executivo é claro, como explicou na ocasião a ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho. Se tudo correr como o planejado, a mudança entraria em vigor no começo de 2023.
— Garantir que todos os trabalhadores tenham um contrato de trabalho, independentemente para quem trabalham — afirmou Godinho.
A iniciativa faz parte do Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho e segue diretiva da comissão europeia sobre o vínculo nas plataformas digitais, que não fala em intermediários, mas no reconhecimento de contrato com as multinacionais. Também há proposta neste sentido do Bloco de Esquerda. Ambas são rejeitadas pelos brasileiros, como Plínio Santos.
— Criamos um grupo espontâneo e voluntário e enviamos o nosso contributo ao Parlamento. (…) Nossa voz continua muito baixa, visto que nossas vontades e interesses não são ouvidos e sequer chegam a ter visibilidade na opinião pública — escreveu o motoboy em mensagem enviada ao Portugal Giro.
No texto dos motoboys endereçado à Comissão Parlamentar de Trabalho, Segurança Social e Inclusão, uma pesquisa do Instituto Universitário de Lisboa é listada como argumento: “87% dos estafetas das principais plataformas digitais a operar em Portugal dizem que querem continuar como freelancers”.
O motoboy Tiago Silva explica ao Portugal Giro os motivos de recusarem vínculo com empresas de aplicativos de entrega.
— Trabalhar para os aplicativos é ruim. Na Espanha, aconteceu o que querem fazer em Portugal e o resultado foi: ganhos mensais e pessoal reduzidos drasticamente e uma empresa deixou o país após a aprovação — disse Silva.
Na Espanha, a “Ley Rider” entrou em vigor há um ano e até a última semana uma empresa multinacional de entregas estava sob a suspeita de seguir contratando milhares de motoboys autônomos. A ministra do Trabalho, Yolanda Díaz, defendeu a lei ao declarar que a maioria das empresas se adaptou.
O núcleo do texto do movimento em Portugal gira em torno da liberdade. E traça um perfil destes trabalhadores. “Uma alteração na lei em vigor que acabará de forma desastrosa com a nossa liberdade e direito de escolha (…) Apenas 10% se dedicam somente a esta atividade, 26% indicam ter outro emprego a meio período ou integral, 12% têm outras plataformas, 9% são estudantes e 6% cuidadores de idosos”.
Os motoboys podem ser independentes em relação às plataformas e pagar mensalmente a taxa da Previdência Social como autônomos. Mesmo sem querer vínculo, querem trabalhar como freelancers diretamente para mais de uma plataforma ou para empresas terceirizadas.
Também é público que desejam melhores condições de trabalho, que passam por remuneração, metas de entrega e jornadas justas e com mais segurança.
“Defendemos o modelo atual (…) visto termos as regalias de definir o nosso plano de trabalho sem ter que prestar contas para entidade patronal, ou ser obrigado a cumprir uma determinada quantidade de horas, ou quantidade de entregas pois é o que somos, independentes. Com possibilidade de escolher quando ligar o aplicativo e com opção de conectar mais de uma plataforma”, informa o texto, que prossegue:
“Usam o nome da nossa classe para dizer que defendem um modelo com presunção laboral, sem sequer conhecer a nossa realidade, que em nada nos representam e muito menos visam melhorar a situação da classe”.